Não andeis ansiosos pela vossa vida… (Jesus—Mateus 6.25)
Era domingo de manhã. O culto havia terminado e Isabel subia a escada em direção à sua classe de Escola Dominical.
—Oi, Isabel. Está sozinha hoje? Cadê Neto? Senti falta dele na Santa Ceia.
— Tudo bem, irmã? Neto teve que viajar às pressas, a trabalho. Deve voltar na quarta.
— Quem vai ensinar a classe dele?
— Adivinhe?!
— Você?
— Pois é.
Uma vez dentro da sala, Isabel esperou os casais se sentarem, conversando com um e outro sobre eventos, compromissos e preocupações nas vidas destes. Depois começou:
— Irmãos, na sexta-feira, Neto soube de repente que teria que viajar pela firma. Ele ligou para mim do trabalho, preocupado com a lição de hoje. Pediu-me para entrar em contato com o irmão Dinei para substituí-lo. Descobri, entretanto, que ele estaria visitando os sogros em Minas. Sobrou para quem? Neto sugeriu que eu fizesse o estudo. E aqui estou eu. Irmã Helena, a senhora poderia pedir a bênção a Deus sobre o que será falado aqui hoje?
Depois da oração, Isabel colocou um vidro na mesa e tirou um papel impresso da Bíblia.
— Irmãos, nossa lição de hoje tem o título Os propósitos da providência divina no sofrimento do crente. Com certeza, todos nós já temos sofrido. Alguns estão sofrendo hoje. A irmã Sônia não está conosco porque está lutando contra o câncer. Pedro está se esforçando para cuidar da sua mãe com a doença de Alzheimer. Na semana passada, Roberto perdeu o emprego repentinamente. Uns têm filhos doentes. Outros choram com filhos rebeldes. Todos nós iremos passar por aflições, sejam grandes ou pequenas.
— Jesus nunca prometeu que seus seguidores teriam uma vida sem sofrimento. Ele falou, No mundo passais por aflições. Ele não disse, Talvez ou nunca passais. Então o que marca a vida do cristão não é a ausência de problemas. Se a gente for olhar o capítulo inteiro, veremos quais as aflições a que o nosso Senhor Jesus se refere. Ele fala na futura expulsão, morte, choro, lamento e tristeza dos discípulos, no ódio e na incompreensão do mundo… Mas, como é que ele conclui o seu ensino? Mas tende bom animo, eu venci o mundo. Alguém sabe como o versículo começa? Não? Estas coisas vos tenho dito para que tenhais …? Está certo, … para que tenhais paz em mim [1].
— Como é que Jesus pôde esperar que eles tivessem paz? E que nós tenhamos paz? Afinal, no capítulo seguinte, ele ora por nós também. Vejam o versículo 20 – Não rogo somente por estes, mas também por aqueles que vierem a crer em mim…. Sabe, irmãos, a paz interna é possível somente quando se tem certeza que Deus está no controle. Que ele está supervisionando tudo. Sempre. Que ele nos guarda. Que ele nos ama. Alguém leia os versos 15 e 23, por favor.
— Sabe, nosso Deus rege não apenas os macro-eventos, mas também os micro-eventos, os mínimos detalhes… É isto que chamamos de providência divina. Eu quero ler para vocês algo que escrevi, que descreve uma experiência que Deus me permitiu ontem, que acabou tendo tudo a ver com nossa lição.
E Isabel começou a ler:
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Ontem, parei num lava-rápido…
Outros carros haviam chegado antes de mim, e, assim, fui conduzida para a área de espera — um pequeno galpão onde havia algumas mesinhas e cadeiras empoeiradas. Sentei-me ao lado de revistas velhinhas e peças de dominó.
Fiquei sozinha naquele canto, lendo, e anotando pensamentos para a lição que eu teria de ensinar—sobre a providência de Deus. Havia um carro estacionado entre mim e os lavadores e a leitura ia bem, embalada ao som dos jatos de água, do aspirador de pó e do zum-zum dos automóveis que passavam bem ao lado do portão.
De repente, comecei a notar umas coisinhas voando ao meu redor. Flutuavam suavemente, caíam no meu colo, batiam no rosto, colavam no cabelo e acabavam no chão. Quando olhei, percebi que já havia milhares delas naquele chão de cimento.
Abri minha mão e deixei algumas cair nela. Eram pequenas sementinhas penduradas em pára-quedas sedosos. Lá naquele canto escondido, sem beleza nenhuma, Deus estava me concedendo um espetáculo particular.
Na minha mão, a criatividade de Deus na perfeição de uma única pluminha esférica e simétrica agarrada à semente.
No chão, o vento as juntava e, depois, as dispersava, desenhando formas variadas no concreto limpo. Pequenas petecas, projetadas para voar.
Continuei olhando. Verifiquei ao redor—só tinha concreto. Nenhuma planta, nenhuma árvore. De onde teriam vindo tantas sementinhas? De que tipo de árvore? Do quintal de um vizinho? Eu não sabia. Mas suas sementes estavam dançando diante de mim— glorificando a Deus com a sua delicadeza e leveza.
Fiquei com vontade de chamar os lavadores para virem olhar comigo. Queria tanto poder compartilhar aquela maravilha com alguém. Mas sabia que eles poderiam me achar louca. E assim fiquei quieta no meu cantinho, observando, meditando no plano de Deus para propagar a árvore da qual elas haviam saido. Plano de Deus… Providência de Deus… Huuummm… Sobre o que mesmo eu estava estudando?…
De repente, percebi que aquelas sementinhas voadoras, que pareciam tão frágeis e diminutas, realmente não eram insignificantes. Comecei a pensar sobre as árvores da história e do Novo Testamento. Deus na sua providência, há milhares de anos, havia planejado até o local e o dia em que brotariam as sementes que se transformariam naquelas árvores.
Veio à memória as árvores das quais o povo tirou ramos para saudar o Messias na entrada de Jerusalém [2]. Pensei em Zaqueu subindo no sicômoro para ver Jesus [3] e na planta que Deus fez crescer para ensinar compaixão a Jonas [4]. Lembrei-me de Natanael sentado debaixo da figueira [5] e das outras figueiras na beira da estrada[6] que Jesus usou para ilustrar sua mensagem sobre o reino de Deus[7]. Todas “plantadas” por Deus por meio de pequenas e insignificantes sementes trazidas, ao seu mando, pelo vento ou pelos pássaros ou, talvez, até por meio do resto de uma fruta displicentemente jogada no chão por um habitante palestino. As sementes brotaram e as árvores cresceram, até um dia cumprirem os seus propósitos — cada uma entrando na narrativa bíblica, cada uma ilustrando alguma mensagem divina.
Aí eu arranquei umas folhas do meu caderno e apanhei vários punhados de sementinhas. Chegando em casa, coloquei-as em um vidrinho para poder compartilhar a experiência com minha classe e usá-las como ponto de partida da minha lição.
Sementes, árvores, flores… Deus cuidando de cada planta… E mais ainda, Deus cuidando de mim… Até nas horas do sofrimento… Tenho o dever e o privilégio de confiar nas palavras do Filho dele quando diz que não devo ficar ansiosa. Afinal, meu Pai celestial se preocupa em enfeitar os lírios e sustentar as aves [8]. Ele sabe até quantos cabelos estão na minha cabeça! [9]
Ontem vislumbrei sua providência através da sua criatividade na natureza. Almejo sempre estar atenta para avistar seu amor nos ambientes mais áridos e nas angústias mais avalassadoras.
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Isabel despejou algumas sementes na sua mão e soprou-as em direção à classe. Algumas pessoas estenderam as mãos para acolhê-las e mostrá-las às que lhes cercavam.
— Que lindas!
— E olhe como ficaram no vidro. Parece até uma colmeiazinha.
— Mas tecido com fios de aranha em vez de cera!
— Meu Deus, que perfeição!
Isabel continuou falando:
— Irmãos, vocês estão vendo a beleza e a delicadeza destas minúsculas petecas, desenhadas e criadas por nosso Deus? Só nesse vidrinho tem centenas delas. São tão diminutas, que seriam imperceptíveis se tivessem caído em outro lugar. São desconhecidas – ninguém aqui sabe o nome ou a natureza da árvore ou planta da qual vieram. Mas elas fazem parte dos planos de Deus para nosso mundo. Ora, irmãos, se Deus veste assim a sementinha da árvore, que hoje está voando pelos ares e amanhã vai ser pisada, quanto mais tratando-se de nós, homens e mulheres de pequena fé [10].
— Vamos ler Mateus 6.25-34 em conjunto. Irmão Leandro, o senhor pode ler o primeiro versículo?
Elizabeth Zekveld Portela
Publicado na SAF em Revista, 1º Trimestre / 2005
[1] João 16:33
[2] João 12.13
[3] Lucas 19.4
[4] Jonas 4.4-11
[5] João 1:48
[6] Marcos 11.12-26; Mateus 21.19-22
[7] (Mateus 7.16-20). Lucas 6.1-5 e 13.1-9
[8] Mateus 6.26 e 28
[9] Mateus 10.30
[10] Adaptação de Mateus 6:30; Lucas 12:28
SUGESTÕES PARA MEDITAÇÃO E/OU ATIVIDADES
1. Jesus deixou seus ouvintes enxergarem e apreciarem o poder, os princípios e a providência de Deus através de elementos na natureza que lhes cercavam. Tente imaginar a multidão se acomodando em um monte, evitando espinheiros e abrolhos, procurando a sombra de arbustos e árvores, enquanto passarinhos e aves, cantando e chilreando, pairam e voam, em meio à maciez da relva e o colorido das flores silvestres. Agora, coloque-se (ou o grupo) num ambiente onde há plantas e pássaros (pode ser um quintal ou uma varanda, um video ou um DVD com imagens e sons da natureza, ou até um bosque, um campo ou um parque). Leia(m) e medite(m) em Mateus 6.25-34.
2. Compartilhe experiências semelhantes do seu passado que Deus utilizou para enriquecer asua vida espiritual ou a de uma pessoa querida, em uma hora de grande aflição.
3. Passe alguns dias acordando de manhã e prestando atenção ao canto dos pássaros. Conte as borboletas, observe as flores que enfeitam o seu caminho, perceba a variedade de tonalidades no verde, procure enxergar os frutos e as sementes. Comente o que está vendo com Seu Pai celestial em oração e peça discernimento a ele para saber se está realmente buscando, em primeiro lugar, o seu reino e a sua justiça. Então, entregue a ele, o Criador, tanto das estrelas quanto das pequeninas sementinhas voadoras, o problema que está mais lhe inquietando. E a paz de Deus, que excede todo o entendimento, guardará o seu coração e a sua mente em Cristo Jesus. –Filipenses 4.7