“É Ele que nos conforta … para podermos consolar” —2 Coríntios 1.4
Isabel encostou a testa quente na janela do avião. Enquanto a aeronave subia, suas feições, desalentadas a principio, suavizaram-se. Observava, à luz do amanhecer amazônico, o lento sumiço da nítida demarcação do encontro das águas escuras do Rio Negro com as barrentas do Solimões. Era o mais conhecido marco turístico do seu novo lar. Pensou na Vovó Valdete, lá em baixo, que havia vindo de Recife para que ela pudesse viajar. Seria um grande desafio cuidar de três netinhos em meio a caixas de mudança ainda desfeitas, num lugar totalmente desconhecido.
Seu olhar, cansado do verde interminável, retraiu-se, focalizando no título do livro no seu colo—”Aflição“. A palavra resumia aquilo que lhe esperava no fim daquele vôo. Fechando os olhos, tentou visualizar o rosto da sua mãe. Fazia mais de dois anos que as duas não se viam. O que estaria acontecendo lá, no outro hemisfério? Ao chegar, seria levada a um hospital ou a um velório?
—Ó Deus, tu que tens me sustentado durante este mês tão caótico, me ajudes agora. Não dormi esta noite. Estou cansada e abatida. Ontem me disseram que o médico não dava mais esperanças. Sei que tu podes restaurar-lhe a vida mas não sei se será este o teu propósito. Como devo me preparar? Como vou agüentar?
Folheando o livro, seus olhos caíram numa passagem grifada. “Bendito seja o Deus e pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai de misericórdias e Deus de toda consolação. É ele que nos conforta em toda a nossa tribulação, para podermos consolar aos que estiverem em qualquer angústia, com a consolação com que nós mesmos somos contemplados por Deus…. Se somos atribulados, é para o vosso conforto e salvação. Se somos confortados, é também para o vosso conforto. ” (2 Coríntios 1.3,4,6).
Lembrou-se que havia usado estes versículos para se auto-encorajar durante sua recente mudança do litoral nordestino para o meio da floresta amazônica por razão do trabalho do seu marido– naquilo que pensavam ser uma curta estadia. Mas a realidade inicial havia sido um tanto diferente daquilo que esperavam. De repente, perceberam que estavam em uma nova e prolongada fase de vida. Atravessavam um duro treinamento para, daí em diante, poderem reconhecer e aliviar as necessidades de pessoas recém-chegadas a um local. Toda a infra-estrutura, construída durante 13 anos, não existia mais. A nova casa era linda, mas vazia. O caminhão de mudanças permaneceu retido no porto durante duas semanas. No lugar do fogão, uma frigideira elétrica. Em vez de geladeira, uma caixa de isopor com gelo. Roupas torcidas a mão demoravam dias para secar na chuva e na umidade da região. Nenhum carro para fazer compras, contatos e passeios, enquanto Neto passava o dia no trabalho… Três crianças pequenas clamavam por sua atenção pois não havia televisão, nem avós, nem amiguinhos,… E, em meio a tudo isso, a preocupação com a mãe — tão doente, tão distante…
— Senhor, a aprendizagem não foi fácil, mas assimilamos a lição. Nós nos tornamos muito mais sensíveis às necessidades daqueles que mudam de cidade ou de país. Sentimos solidão, saudades, incertezas, medo, desinteresse,… Mas vimos a sua mão trabalhando, trazendo conforto e alívio de maneiras tão especiais.
— Agora, porém, o Senhor inventou uma outra “tribulação” para mim. Nem me deu tempo para respirar um pouco! Isto significa um novo aprendizado e desconfio que essa lição vai ser bem mais difícil! O Senhor está me preparando para consolar alguém na doença? Ou vai ser na morte? Vejo agora que a nossa adaptação ao novo lar é um sofrimento temporário, transitório, com poucas seqüelas ou traumas. Mas, desta vez, é a minha mãe que está morrendo! Estou tão angustiada! Não posso mais simplesmente “aguentar firme pois vai passar”. Não sei o que está acontecendo, não posso ajudar e nem estou lá para me despedir!
Sentiu uma mão no seu braço. A senhora ao seu lado apontou uma gringa forte e resoluta, de pé no corredor. A mulher explicou que somente conseguia dormir encostada na janela. Pensava que Isabel poderia trocar de lugar com ela pois precisava chegar repousada ao seu destino.
— E agora, meu Pai, clamou o coração de Isabel. — Pensei que o Senhor tivesse arrumado este cantinho gostoso para mim!…É assim que vai me consolar? O que faço agora? Tenho certeza que o cansaço daquela mulher não supera o meu! Deu uma olhada na fisionomia das duas. Era óbvio que a senhora da poltrona vizinha não ficaria muito amável se ela se recusasse. — ‘tá bom, Pai. Vou ceder meu lugarzinho. Mas não estou gostando! Lentamente, juntou seus pertences e procurou o assento abandonado pela senhora fatigada.
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Enquanto isso, num hospital do Canadá, uma equipe cirúrgica lutava pela vida da D. Gertrudes. O médico que disse à família que ela estava morrendo, havia saído de férias. Seu substituto não hesitou em procurar recursos mais sofisticados para salvar a vida da nova paciente. Em poucas horas ela, já inconsciente, se encontrava num helicóptero em direção ao hospital mais renomado da área, deixando para trás a pequena instituição rural em que havia sido operada de câncer. Após a cirurgia, Nelita entrou na UTI com seu pai. Alisou o rosto inchado da mãe e sussurrou no seu ouvido — Mamãe, Isabel está a caminho. Ela já está no avião. Mamãe, a senhora está ouvindo? Isabel vem!
Aquelas palavras penetraram os efeitos narcóticos das drogas que mantinham D. Gertrudes viva e ela conseguiu apertar a mão da filha mais nova, que também havia atravessado o continente para estar com ela. Enquanto flutuava entre a vida e a morte, um único pensamento se repetia: — Isabel vem… Isabel vem… Isabel vem! Vou ter todos os meus filhos comigo!
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As poltronas ao lado do novo assento eram ocupadas por um casal americano de meia-idade. Havia uma Bíblia aberta no colo dele. Observando que estavam lendo em Filipenses, Isabel sorriu para eles e tirou seu livro da bolsa. Queria tê-lo à mão entre uma soneca e outra. Mas o senhor ao seu lado olhou a capa e perguntou com compaixão, — Por que você está lendo um livro sobre aflição?
Foi assim que começou uma conversa preciosa. O sono se afugentou e, durante horas, três seguidores do Caminho compartilharam as palavras consoladoras e orientadoras que já haviam aprendido no seu andar com Deus. Bill e Bárbara contaram que tinham participado do casamento de uma amiga. Estavam voltando antes porque William, seu filho de 21 anos, havia caído no trabalho. Exames médicos haviam revelado um tumor cerebral. Faltava confirmar se era maligno mas os médicos não estavam otimistas. Uma enorme pergunta pairava nos seus corações. O acidente seria a maneira divina de lhes apontar o problema em tempo ou…?
Isabel compartilhou os eventos das semanas que antecederam o seu próprio embarque naquele vôo. Relatou a sua revolta inicial quando, em meio aos transtornos e à adaptação, soube do estado crítico da sua mãe querida. Descreveu também como havia visto a misericordiosa mão de Deus preparando tudo para possibilitar a ida dela, a vinda da sogra (e, finalmente, a entrega da mudança!). Continuou dizendo: — Tenho amigos que acham que eu devo insistir com Deus para curar Mamãe e que só basta eu ter fé para Ele me atender. Mas eu não fui criada assim. Aprendi que posso abrir meu coração com Ele e compartilhar os meus sonhos e desejos. Ele me ouve e me ama. Mas sei que eu sou muito pequena diante dele. O meu ponto de vista é tão limitado. O dele abrange o universo inteiro e compreende tanto o passado quanto o futuro.
Foi isso que Jó também experimentou quando Deus perguntou: Quem é este que escurece os meus desígnios com palavras sem conhecimento? concordou o Bill. Com uma serenidade surpreendente, ele leu Filipenses 4.4-13 para Isabel. Não andeis ansiosos de coisa alguma… Sejam conhecidas diante de Deus as vossas petições, pela oração… A paz de Deus, que excede todo o entendimento, guardará… Aprendi a viver contente em toda e qualquer situação…. Com voz triunfante e embargada ao mesmo tempo ele concluiu —Tudo posso naquele que me fortalece! Folheou algumas páginas e parou em Romanos 12. Temos que apresentar os nossos corpos como sacrifício vivo,… ser pacientes na tribulação,… não deixar que sejamos vencidos do mal, mas vencer o mal com o bem…. Se a gente permitir que este problema abale a nossa confiança em Deus e nos torne servos inúteis, então estaremos deixando o mal—o sofrimento, a doença e a morte trazidas por Satanás—nos vencer.
Isabel concordou e complementou: 2 Coríntios 1 fala que devemos confortar os outros usando o consolo que Deus nos deu no passado. Isto significa que temos que estar procurando enxergar todos os aspectos deste consolo. Temos que ver a mão de Deus trabalhando não somente na conclusão mas especialmente nos detalhes. Esta conversa que estamos tendo, por exemplo, é uma prova disto. Vocês estão passando para mim aquilo que Deus lhes mostrou e penso que eu estou fazendo a mesma coisa. Temos sido confortados sem saber se seu filho ou a minha mãe serão curados.
Juntos os três se emocionaram, choraram, sorriram. De mãos entrelaçadas, procuraram o consolo e a intervenção divina em oração. Finalmente, o casal reclinou suas cadeiras para dormir. Isabel ficou sorvendo um suco em pequenos goles enquanto refletia sobre como era bom poder se entregar aos cuidados de Deus.
—Pai, eu estou envergonhada. Quase que perco este consolo, relutando contra um pequeno sacrifício. Ajuda-me a continuar neste caminho, vivendo e aprendendo na tua presença a cada momento, sem reclamar, duvidar ou vacilar—não importa o que me espera no fim deste vôo. Fechou os olhos e não permitiu que voltassem as imagens tristes que pairavam no limiar das suas emoções—da sua mãe num vestido florido, imóvel num caixão, voltando à terra, enquanto a sua família recebia os pêsames dos presentes. Dormiu um sono profundo até a hora da aterrizagem. Despediu-se do casal com um caloroso abraço, troca de endereços e promessas de intercessão. Depois prosseguiu para o vôo seguinte.
Finalmente, o último pouso. Após um longo corredor, a alfândega canadense. O senhor no guichê carimbou seu passaporte e sorriu. “Have a good stay”. —Uma boa estadia? Será, Senhor? As portas automáticas se abriram. No outro lado três homens altos e loiros se destacavam na multidão que esperava. Seu olhar ansioso percorreu os rostos de cada irmão. Refletiam cansaço e preocupação mas estavam sorrindo. A sua mãe ainda estava viva!
E enquanto eles se locomoviam pelas avenidas vazias da madrugada em direção ao hospital, houve novamente a consolação mútua “com a consolação com que eles mesmos foram contemplados por Deus“. Os irmãos compartilharam a inesperada série de eventos que haviam evitado a morte da mãe até aquela hora. Isabel contou da sua angústia inicial e da sua relutância em ceder o seu lugar, para em fim descobrir que era assim que Deus pretendia lhe usar e confortar. Comovido, seu irmão caçula comentou,
— Não sabemos se Deus vai realizar o milagre da cura da nossa mãe mas de uma coisa podemos ter certeza—Ele está agindo. Está agindo na vida dela, na nossa e, através das nossas ações e reações, na dos outros também. Vejo que o nosso papel é de cooperar com ele e não envergonhá-lo nesta hora de crise. Os outros concordaram.
— Amem, disse Isabel. Nosso Deus realmente se importa com o consolo de todos os seus filhos!
Publicado na SAF em Revista, 3º Trimestre / 2000
Esta história é baseada em fatos verídicos. Os nomes das personagens foram modificados. Deus ainda permitiu um ano de vida à mãe de Isabel—ano cheio de lembranças e lições especiais para a sua família. O tumor do rapaz era maligno e ele veio a falecer algum tempo depois. Quando Isabel chegar no céu, ela espera poder olhar os arquivos celestiais (que imagina existir em forma audiovisual). Pretende deleitar-se na visão ampla e total de como Deus trabalhou em todos os detalhes da sua vida—inclusive naquela viagem. E isto a motiva a continuar fiel pois quer poder regozijar-se não somente que Deus trabalhou a despeito dela mas também através de sua vida, nas ocasiões em que ela se entregou por inteiro aos seus desígnios e confiou na sua divina sabedoria. (O livro referido é “Affliction” de Edith Schaeffer, 1978). (Texto citado sem referência: Jó 38.2)
Versos sobre o Consolo Divino: Isaías 40.28-31; 41.10; 53.3,4; Jeremias 33.3; Lamentações 3.21-33; Romanos 8.17-28,35-39; 1 Coríntios 10.13; 2 Coríntios 1.3-7; 4.8-18; 11.30; 12.7-10; Filipenses 4.6,7-13; Hebreus 13.5,6; 1 Pedro 5.6-10; Apocalipse 2.10
Hoje precisando de um consolo divino abri este site. Vivo dolorida, decepcionada. Hoje fui agredida fisicamente pelo meu neto muito amado de 9 anos que foi abandonado pela mae e, entregue ao pai. Ela se casou pela 2 vez e abandonou o 1 filho apos o nascimento do 2. Espero que Deus aja na minha vida como fez na de Isabel. O que me doi mais que a agressao sofrida é o medo do futuro dessa criança. Perdoem-me!
Senhor Deus, ajuda-me a desfrutar desse consolo que estas pessoas desfrutaram.
Entrei nesse site por acaso, buscando consolo e sabedoria vindos de Deus para enfrentar um problema de depressão na minha família. Milagrosamente veio-me a mensagem divina inpirando-me a confiar no Espirito Santo e já estou sentindo-me mais leve em ter depositados o meu problema na mão do Senhor. Com certeza venha o que vinher ele estará comigo e com meus familiares nos amparando e nos dando força.
Amém . Louvado seja Deus,
Hj ntrei na interner em busca de saber de Deus como consolar alguém que está sofrendo com o cancer de uma enteada jovem. Não sei o que dizer, embora sinta que a pessoa só queira a minha presença e os meus ouvidos.Tenho fé no Senhor e sei que Ele faz como lhe apraz, tomara que eu saiba ajudar, pois as vezes me sinto impotente. Deus nos ajude a sermos a cada dia pessoas melhores. Amém.
Elizabeth,
Às vezes sinto meu coração angustiado, principalmente com o sentimento da perda de pessoas queridas, porque à medida que vamos
envelhecendo, parece, que esse sentimento se torna mais forte.
A Crônica de Isabel, trouxe alento, confiança no nosso Deus, que é sábio, bondoso, misericordioso e sua vontade é perfeita.
Sou grata à Ele, por ter me permitido ter acesso à essa leitura e à vc.
pela sensibilidade e generosidade de partilhá-la conosco.
Um abraço da sua irmã em Cristo,
Tânia Cassiano
Olá! Meu nome é kely e quero agradecer por compartilhar esta história com aqueles q buscam, até mesmo sem saber, o amor do Senhor. Meu pai está com um câncer maligno no pescoço e tudo q eu desejo é consolo e direção. Aqui , CERTAMENTE o Pai usou vc e este texto pra me dar umpouco mais do q preciso!! Bjs, muita paz e parabéns! Que o mesmo amor e consolo q senti invadam seu ser em toda dificuldade! Até a próxima…
Hoje me sentindo angustiada e aflita encontrei esse site, minha vida não tem sido fácil como as de muitas pessoas e eu só peço ao Senhor Nosso Deus que me faça forte para suportar toda e qualquer tribulação que eu venha a passar. Deus me perdoe por as vezes me desesperar e vacilar na fé que deposito em ti.
“bem -aventurados os que choram, porque eles serão consolados” Mateus:5-4
Amém.
ando muito triste com minha família queria saber qem esta certo ou errado
Beth, louvo ao Senhor pela sua vida e obrigada por essa publicação tão linda, como é bom e maravilhoso ver o agir de Deus em nossas vidas, Ele nos guarda, nos consola, nos ama, nos perdoa em meio as nossas fraquezas e questionamentos e nos fortace nos tempos de aflições para que possamos ser testemunhas do seu cuidado e misericórdia. Ler um relato desse nos faz refletir como a boa mão do Senhor nos conduz em todo tempo e em qualquer situação, Ele de fato se preocupa conosco nos mínimos detalhes, ouve as nossas orações e as atende no tempo em que Ele mesmo determinou, o tempo que é melhor para nós.
Minha mãezinha está doente do outro lado do Atlântico em Portugal e eu estou de licença médica querendo vê -la, estudando as possibilidades e aguardando o melhor do Senhor eu creio em Sua provisão, Deus é Fiel.
Obrigada pelo consolo.
Jesus a abençoe.