Aprendendo com o Primeiro Casal
Não é bom que o homem esteja só: far-lhe-ei uma auxiliadora que lhe seja idônea.—Gênesis 2.18
Alguns dias atrás, comecei uma série sobre “companheirismo no casamento” aqui. No primeiro post, como introdução, falei sobre solidão e como até pessoas compromissadas com Deus, que sabem que são seus filhos e que oram e lêem a Bíblia, podem ter momentos em que se sentem abatidas e abaladas. Mostrei como o apóstolo Paulo relata um momento na sua própria vida em que o consolo e a alegria apenas retornaram com a chegada de um amigo (Tito) que, por sua vez, trouxe recados e relatos que transmitiam o carinho de outros amigos.
Concluímos, portanto, que Deus também costuma usar gente (outras pessoas) como canais das suas bênçãos, para preencher as necessidades e aliviar a solidão dos seus semelhantes. Devemos encontrar e transmitir amor fraternal no convívio entre os irmãos na fé. Quem realmente se empenha em ser membro ativo e participante de uma igreja, normalmente sabe como é bom fazer parte dessa família. De fato, percebo que uma das razões pela qual nós mesmos ainda não mudamos de igreja, apesar de morarmos muito mais perto de várias outras da nossa denominação, agora, é o amor que sentimos pelas pessoas que se congregam naquele local, e que também recebemos deles.
É uma afeição que é construída e compartilhada entre jovens e idosos, crianças e adultos, ricos e pobres, mineiros e paulistas, homens e mulheres, letrados e analfabetos, professores e alunos, discipuladores e discipulados, pastores e “ovelhas”…. Somos todos irmãos, procurando crescer e trabalhar a serviço de Deus, nosso Pai, fortalecendo-nos mutuamente. E quem se abstém, voluntariamente, de procurar e freqüentar os cultos e atividades de uma igreja, está tanto desobedecendo uma diretriz divina quanto perdendo excelentes oportunidades para diminuir a sua solidão.
Nunca acharemos uma situação ou família na fé perfeita, nesta terra, mas ser membro de uma igreja é uma das poucas maneiras que existem para encontrarmos pessoas comprometidas a se abrirem para ouvir, aconselhar e ajudar a seus semelhantes incondicionalmente (sem exigir retorno ou compensação). É claro que a nossa percepção disso e o tamanho da nossa aproximação fraternal dependem da profundidade dos momentos e experiências que passamos juntos, como ocorre na nossa própria família.
Mas, apesar de sentirmos algumas pessoas mais queridas do que outras, isso não nos leva a excluir os menos aproximados da esfera das demonstrações da nossa benevolência. Quem anda com Deus desenvolve crescente compaixão e uma sempre maior prontidão para acudir aos seres humanos que Ele coloca no seu caminho. E, fazendo isso, recebe a recompensa de Deus de muitas maneiras—uma das quais é uma grande diminuição da sua solidão.
Existe, entretanto, um relacionamento que é o mais especial de todos. Estou falando do casamento—o primeiro relacionamento entre seres humanos criado por Deus. Mas, por que? Muitos de nós têm sido levados a pensar que a função primordial do casamento é a satisfação (e reprodução) sexual. Mas a relação que Deus imaginou e determinou como sendo possível para um homem e uma mulher é muito, mas muito mais do que isto. A longo prazo, enquanto um casal continuar celebrando as suas consecutivas bodas—papel, algodão, linho, prata, coral, ouro, rubi, diamante—o elemento que lhes unirá (além de intimidade física, memórias, filhos, parentes e bens), e que lhes dará mais prazer nessa união, será o companheirismo. Será o feito de ter alimentado e fortalecido as afinidades emocionais, intelectuais e espirituais que enriquecem a intimidade sexual e que farão com que o relacionamento possa melhorar e perdurar para sempre. Será o desenvolvimento de uma apreciação e dedicação mútua que persistirá sem depender de fatores possivelmente passageiros como beleza, circunstâncias, saúde ou bens.
Para começar a entender a importância desse relacionamento entre um homem e uma mulher, no qual o ser humano pode gozar de felicidade e satisfação, precisamos examinar o primeiro “casamento”. Vejamos o registro em Gênesis 2.15 e 18.
Tomou, pois, o SENHOR Deus ao homem e o colocou no jardim do Éden para o cultivar e o guardar.
Disse mais o SENHOR Deus: Não é bom que o homem esteja só; far-lhe-ei uma auxiliadora que lhe seja idônea.
Não era bom o homem estar só! O que?! Afinal, em primeiro lugar, Adão tinha um constante mundo de animais e plantas com que interagir, estudar, brincar, experimentar.
Fico pensando que Adão podia galopar pelas campinas nas costas dos animais, sentindo a brisa nos cabelos. Quando ele se deitava na relva, um ou outro gato provavelmente chegava perto dele, esfregando a cara na sua perna para depois pular no seu colo, ronronando, enquanto Adão passava a mão na sua cabeça e costas. (É verdade que gatos, e também cachorros, fazem significativa companhia para muitas pessoas solitárias, hoje em dia.) Os cachorros talvez vinham correndo ao seu encontro, latindo alegremente, abanando o rabo, lambendo a sua mão…
Mais ainda, Adão tinha a Deus para conversar com ele. Havia sido criado à “imagem de Deus”. Deus era o único ser naquele local que lhe entendia—com o qual poderia haver uma troca de pensamentos por meio verbalizado e com quem podia aprender. Parece que Deus tinha o costume de vir conversar com ele na “viração do dia.” Creio que Adão conversava com Deus regularmente, na perfeição do Éden. Eu não ficaria surpresa em saber que Deus lhe revelou muitos detalhes de coisas que estamos apenas descortinando agora – noções de química, física, astronomia, biologia, botânica, matemática, anatomia, fisiologia, psique, música… Juntando a isso, a auto-revelação de Deus, do seu ser, poder e tremendos atributos, deve ter estimulado conversas fascinantes e estimulantes. Assim, num mundo em que havia apenas harmonia, beleza e descoberta, sem dor nem sofrimento, Adão não era infeliz. Mas, ainda assim, Deus disse: Não é bom que o homem esteja só.
A solução de Deus foi o que agora chamamos de matrimônio ou casamento. Vemos isso claramente nos versículos 20 a 24.
Deu nome o homem a todos os animais domésticos, às aves dos céus e a todos os animais selváticos; para o homem, todavia, não se achava uma auxiliadora que lhe fosse idônea.
Então, o SENHOR Deus fez cair pesado sono sobre o homem, e este adormeceu; tomou uma das suas costelas e fechou o lugar com carne.
E a costela que o SENHOR Deus tomara ao homem, transformou-a numa mulher e lha trouxe. E disse o homem: Esta, afinal, é osso dos meus ossos e carne da minha carne; chamar-se-á varoa, porquanto do varão foi tomada.
Por isso, deixa o homem pai e mãe e se une à sua mulher, tornando-se os dois uma só carne.
Será que o que faltava para Adão era apenas um complemento físico, para que ele pudesse ter o prazer de relações sexuais e de se perpetuar, tendo filhos, como os animais que lhe cercavam? Se focarmos apenas no “tornando-se os dois uma só carne”, podemos até pensar isso.
Lemos, entretanto, que Deus via que lhe faltava uma auxiliadora que lhe fosse idônea. As palavras ajudadora e idônea indicam um relacionamento de apoio e complementação em vários níveis.
Aqui percebemos que o propósito de Deus para o ser humano ia bem além do relacionamento físico, apesar disto já ser algo que o homem não poderia compartilhar com o divino. Deus e Adão não se completavam de nenhuma maneira. Deus já era completo na Trindade. A trindade já se completava emocional, intelectual e espiritualmente. Havia companheirismo entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Desde a eternidade, Deus nunca esteve só no sentido de complementação e comunicação entre seres iguais. E Ele criou o homem não para completá-lo, mas para glorificá-lo.
Adão se viu inserido entre bichos e bichinhos que se completavam de outro modo—fisicamente. Entretanto, não existia alguém da sua “espécie”—reunindo a sua essência física, de carne e osso, com os atributos intelectuais, espirituais e emocionais que refletiam a natureza de Deus. Ele não tinha ninguém como ele, ninguém possuidor de corpo e alma, com quem interagir e conversar. Adão realmente estava só. E isto não era “bom.”
A Bíblia na Nova Tradução na Linguagem de Hoje diz o seguinte: Não é bom que o homem viva sozinho. Vou fazer para ele alguém que o ajude como se fosse a sua outra metade.
A Nova Versão Internacional traduz o texto do original assim: Então o Senhor Deus declarou: Não é bom que o homem esteja só; farei para ele alguém que o auxilie e lhe corresponda.
Portanto, faltou alguém que pudesse lhe corresponder, ajudar, ser a sua outra metade… Foi por esta razão, então, que Deus “inventou” o casamento. Creio que, na terra, é o relacionamento entre seres humanos que fica mais próximo da maravilhosa comunhão que existe entre as três pessoas da divindade—entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo.
O relacionamento humano com potencial para ser o melhor, o mais satisfatório, o mais gratificante, a fonte de mais contentamento – é aquele oferecido pelo casamento—pela vida compromissada entre um homem e uma mulher. E foi assim desde Adão.
De certa forma, não existe nada melhor no mundo do que encontrar e ter uma pessoa com quem casar e ser casado. É melhor do que ter filhos. É melhor do que ter pais e irmãos. É melhor do que ter namorados ou namoradas ou amantes. Existe um anseio dentro de nós por um ser humano com quem podemos dividir tudo. Em muitos níveis. Para sempre.
Você já parou, alguma vez, para pensar sobre por que artistas e profissionais famosos (e pessoas comuns também) se tatuam com o nome ou as iniciais da pessoa amada? Creio que esse ato radical e doloroso reflete a tremenda vontade que existe dentro deles (e delas) de encontrar e manter alguém que será seu para sempre. É como se estiverem querendo garantir um relacionamento tão duradouro quanto a tatuagem. Ou como se a “declaração” externa possa prender o amado ao seu lado, perpetuamente, enquanto tem o efeito de estimular a si mesmo a lutar mais para preservar a tão desejada união. Mas muitos não sabem escolher ou manter seu parceiro. Tantas vezes, a pessoa tatuada e a pessoa homenageada se separam. Não conseguiram preservar a tão idealizada união. E os noticiários sempre incluem a tatuagem nos relatos do rompimento—como uma prova importante do tamanho e duração do amor que alguém sonhava ter. E os repórteres estão sempre curiosos, ao iniciar-se um novo relacionamento, para saber se o nome, ou as iniciais, foram ou serão apagadas (um processo ainda mais doloroso que a colocação).
O relacionamento conjugal (que Deus concedeu a Adão e que continua até hoje, a despeito do pecado ter diminuído o seu brilho) é o único que abrange os quatro aspectos do ser humano. O físico, o emocional, o intelectual e o espiritual. É onde podemos alcançar a intimidade mais completa—onde podemos juntar a intimidade física com a afinidade sentimental—emocional. Onde podemos adicionar ainda, um crescente entrosamento intelectual. Se somar a isto, uma profunda comunhão espiritual e se tudo isto for baseado na confiança, na entrega, no respeito, na fidelidade e no amor—podemos nos deleitar na maneira de viver mais perto do paraíso que existe.
(Vou abrir um parêntese aqui.—Nem todos os seres humanos encontram um companheiro matrimonial. Isto não significa que serão infelizes. Ou não realizados. Pois Deus dá graça, conforto e ânimo através da comunhão do Espírito Santo. Para isso, Ele também usa outros seres humanos para abençoar e encorajar, como já falei na introdução—no primeiro post. Paulo, por exemplo, não era casado enquanto apóstolo. E não era infeliz.)
Entretanto, a maneira ideal, o jeito melhor, de ter os benefícios do companheirismo, é pelo modelo criado por Deus com Adão e Eva. Precisamos entender que o ideal do companheirismo no casamento, foi criado por Deus logo depois da criação de Adão e que esse relacionamento é, portanto, algo de extrema importância para a felicidade humana.
Por que, então, tem tanta gente infeliz no casamento? Inclusive pessoas crentes e bem intencionadas? Falaremos disto num próximo post.
Abraços, Betty
Realmente vivemos uma epoca, em que a solidão vem mesmo acompanhado de esposa e filhos………………..